Em mais uma dessas andanças por aí, me deparei com essa plaquinha numa banca do Mercado Central de Belo Horizonte. Era pra ser um anúncio qualquer, não fosse o significado dessas palavras juntas. Isso mais o clima mineiro foram o bastante pra me permitir alguns minutos viajando no tempo…
Carmo do Paranaíba-MG é a terra da minha mãe e de outros tios. Viveram o início de suas vidas por essas bandas de Minas até que o saudoso Vô Lázaro, depois de muita enxada e roça pra capinar, resolveu “subir a ladeira” rumo ao Planalto Central. Parou em alguns lugares e por fim chegou para trabalhar na construção de Brasília.
Na época, beiradinha dos anos 60, seu Lázaro e dona Júlia saíram de Minas carregando a família e quase nada na mala. De peso mesmo era a coragem para enfrentar o desconhecido, guiados só pela fé em Deus e a esperança em garantir o sonhado “estudo” e uma vida melhor para a já numerosa família. A cada relato de um tio sobre como foi esse caminho, a aventura comandada pelo Seu Lazaro só fica maior. Anda um pouco, pára, consegue um bico, arruma “um troco”. Anda mais um pouco, uma nova cidade, outro bico, mais um dinheirinho… segue em frente. Só com a cara, a fé e a coragem. E a medida que a família crescia e a responsabilidade aumentava, o caminho pra Capital diminuía. É verdade que a necessidade era um incentivo e tanto. Mas tivesse ele se acomodado lá na roça, estaríamos contando hoje uma história diferente.
Como diz o ditado, quem trabalha sempre alcança. Não bastasse o trabalho, a resposta pra tanta fé e coragem não podia ter sido outra. Chegou a Brasília, batalhou que só, conseguiu um espacinho, já não comandava mais a enxada mas sim os panelões pra alimentar a peãozada. E assim… dia a dia, um a um, viu cada filho crescer com uma nova oportunidade, batalhar como ele batalhou, estudar como ele não pode, caminhar com os próprios pés como ele sempre ensinou, vencer como ele venceu. Na base de tudo, sempre por perto, a dupla Lazaro e sua fiel escudeira Julinha.
Hoje penso que as tropeçadas da vida que cada filho teve e ele assistia, certamente eram bico perto do que ele deve ter passado pra concluir essa jornada. Acho que por isso o ar sereno foi uma marca até o fim. Sereno, sério, severo quando precisava. Não admitia uma mentira nem aceitavam nada errado. Perante Deus e os homens, seu Lázaro e dona Júlia foram impecáveis. Nem na pior adversidade – e foram muitas, abriram mão de seus valores sólidos como a realidade dura da vida. Foram exemplos vivos de honestidade, respeito, correção, compromisso com a família. Não foram sábios por livros, mas sábios por natureza. Deixaram um legado que nós netos jamais aprenderíamos em qualquer escola, livro ou faculdade.
Pouco a pouco e anos depois do Vô Lázaro sentar ao lado de Deus, seguimos conhecendo essas e outras pequenas passagens que só reforçam a história que alguns viveram, que a maioria ouve falar, mas que todos admiram. E surpreendem por lembranças que tornam ainda mais corajosa essa história do velho Lázaro e de sua companheira Júlia rumo ao Planalto. Talvez nenhum de nós encararia algo assim nos dias de hoje.
A lição está aí. Vira e mexe a gente dá de cara com momentos pra decidir ir ou ficar. De mudar ou se acomodar. Do caminho fácil e comum, ou difícil e vencedor. Hora de lembrar dele, porque talvez falte uma pitadinha de coragem e fé como teve nosso avô. Meio sem querer, acredito que eu já tenha utilizado uma lição que, agora sei, seu Lázaro era o mestre: vá em frente, acredite, pode colocar o pé. Tenha fé e confiança que Deus vai providenciar o chão. Sempre dá certo.
Ah… e o que tem haver o queijo? Não fosse pela mineirice típica, o queijo foi mais um símbolo dessa história que devemos nos orgulhar. Sabe-se que anos depois da inauguração da Capital, seu Lázaro carregou muito queijo nas costas pra vender pela cidade.
Talvez o queijo da cesta nem fosse lá “do Carmo” como esse aí da foto. Talvez a cesta estivesse cheia de pão de queijo, pastel ou outra coisa qualquer. Ainda… talvez eu tenha deixado meu pensamento ir longe demais ao me deparar com essa plaquinha e suas duas palavras mágicas – queijo e Carmo.
Certeza mesmo é que o ombro que carregava a cesta era do velho Lázaro. Graças a coragem dele e da dona Julia, graças aos ensinamentos repassados por nossos tios, pais e mães, graças ao queijo e por que não, graças a um vento encorajador soprado lá no “Carmo”, hoje temos boas lições pra seguir, viagens por fazer, histórias pra contar, motivos de sobra pra nos orgulhar. Inspirados pela sua fé, estimulados por sua coragem.
🙂